sábado, 1 de abril de 2006

Estratégia Nacional

Prometido para Abril, começo hoje a divagar sobre a estratégia nacional, ou a ausência dela. Eu entendo que o país desde há anos que não tem estratégia. O que também não é nada inédito em Portugal. Sem estar com grandes delongas diria que estratégia, amiudadas vezes confundida com geoestratégia, é o plano de acção, o delinear a jogada para a vitória do jogo, o traçar do rumo para se atingir um porto seguro. «Quando um Homem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe é favorável.» E o país está sem rumo, sem estratégia. Um bom indicador para se aquilatar isso é a falta de esperança que os cidadãos portugueses derramam pelas calçadas da sua amargura. Mesmo que se fomente, aqui e ali, umas encenações de optimismo pinceladas com musicalidade e glamour artificial, a falta de esperança persiste. Um povo sem esperança é um povo moribundo. A sociedade portuguesa sente que tudo tem vindo a piorar, e sente a certeza de que o dia de amanhã vai ser pior do que o de hoje, e assim sucessivamente, como vem sendo uma constante de há anos. Houve períodos em que os portugueses se auto-iludiram, como se fosse uma embriaguez onde pudessem não encarar a realidade. Actualmente não há forma de fugir a encarar a realidade. E não encontram solução para terem esperança. Ninguém tratou dos planos, dos rumos, enfim, de viabilizar o país. E quando eu me refiro a ninguém, incluo, o que é óbvio, os governos e dirigentes políticos, mas também os portugueses, todos, que para isso contribuíram, nem que fosse pela simples demissão cívica.
Os portugueses encontram-se hoje sem capacidade para reagirem. O Fernando Pessoa falou em falta de elites. Que são fulcrais, também. Mas se investimos bastante na instrução de alguns jovens dedicados, é quase certo que vão parar ao estrangeiro, onde vão contribuir para o desenvolvimento da terra de acolhimento, normalmente porque são escorraçados do país. E então se sobressaem pela sua capacidade, é certo e sabido que são “expulsos”. A pátria não gosta muito de excelência. O meu pai, quando fui para a tropa, deu-me um conselho: «Na tropa nem bom cavalo nem mau cavalo; se é mau cavalo todos lhe batem, se é bom cavalo todos o montam». A mediania medíocre é o mais ambicionado. Portugal é o país do cinzento. A inveja e a intriga bailam pelos interstícios da mentalidade dos portugueses. A administração da coisa pública é perra porque reflecte tudo o que acabo de referir. E tudo o que está perro, senão é reparado ou oleado, mais perro vai ficando, tendendo para o imobilismo, aqui sinónimo de finis patriae.
Mas vejamos a consubstanciação da falta de esperança. Portugal foi sempre um país com problemas demográficos. Os reis da primeira dinastia, em geral, tiveram uma preocupação na ocupação humana do território. Era fulcral para uma boa administração da coisa pública. Chegamos ao século XXI e deparamos com um quadro “moderno”, de “acção”, “inovador”, “competitivo”, de desertificação do interior do país continental (também se pode falar do insular) que não se conjuga com parâmetros geoestratégicos. Se falarmos só em escola com poucos alunos, pode-se pensar em encerrar. Se falarmos só em maternidades com poucos partos pode-se falar em encerrar. E o mesmo para demais serviços públicos, portanto dependentes do estado, para o bem comum. Mas como um bom gestor da coisa pública tem de ter uma visão global, esses encerramentos e falta de outras condições de desenvolvimento são uma catástrofe. Como são catástrofe os gestores da coisa pública. As pessoas sempre procuraram melhores condições de vida. Mas então quando lhes tiram as poucas que tinham, não lhes resta alternativa senão partirem e abandonarem. E é neste ponto que já não há esperança. A asneira foi sendo feita ao longo de anos. Está-se a atingir o ponto de não retorno. (Talvez um dia desenvolva este tema do não retorno). Afluir para as grandes cidades não é já a solução nem para quem chega, nem para já está. E com falta de esperança a prevalecer, das grandes cidades para a emigração. Aqui nos Açores nota-se um certo despovoamento das ilhas mais pequenas a favor de S. Miguel e da Terceira, mas com a Terceira já a perder embalagem a que se seguirá, inevitavelmente S. Miguel. Sem esperança não há futuro, pelo que é necessário procurar no estrangeiro. Parece que a emigração hemorrágica é o desígnio de Portugal. Se não se arranja forma, sem se invocar milagres nem santos, padroeiros ou não, o futuro de Portugal poderá ser exíguo. The answer, my friend, is blowin' in the wind....
Do mal português falarei amanhã.
Recomendo hoje, de Franco Nogueira, “Juízo Final”.

3 comentários:

Caiê disse...

Se não há uma direcção, toda a manobra é inútil. Os portugueses eram bons "navegadores", mas, entretanto, esqueceram-se de como se "navega", perderam o rumo. Nunca se voltaram a encontrar. Os capitães, antes corajosos e inventivos, reduziram-se, por falta de iniciativa, a grumetes que esperam por um barquinho salva-vidas que os venha, miraculosamente, salvar...

Nuno Barata disse...

Franco Nogueira, aparte as suas convicções politicas, terá sido um dos últimos politicos portugueses com noção da importância da estratégia.

AQUILES disse...

Nuno Barata
e do enquadramento geoestratégico.
Lê o livro "Juizo Final"