sábado, 29 de dezembro de 2007

UM REFERENDO É MEU, OUTRO É TEU, OUTRO DE QUEM O APANHAR

No artigo «A Dúvida», publicado no DN de 27 de Novembro de 2007, o Prof. Adriano Moreira rematou assim o seu artigo:
Neste debate, que de certo se vai animar à medida que se aproxima o fim do tempo das hesitações, perde-se talvez a lembrança daquilo que parece ser a principal questão do importantíssimo processo: que os interessados, que são os eleitores, tenham informação suficiente para compreender o que está em causa, no que respeita ao seu país, à sua Europa, à sua vida, ao seu trabalho, ao resto dos seus dias, ao futuro dos seus filhos.Não são porém dificuldades de entender o texto organizado por técnicos versados nas complexidades e minúcias dos acordos e compromissos que justificam a opção entre parlamento e referendo.A tradicional política furtiva, desenvolvida à margem da intervenção dos eleitorados nacionais e dos respectivos parlamentos, não resulta da complexidade dos textos normativos, para o entendimento e desenvolvimento dos quais os próprios governos vão continuar a recorrer a assessorias várias e a lidar com desencontradas interpretações judiciais, para além de as instituições europeias terem de reinventar os usos e costumes que harmonizam as competências, as tradições e as pretensões. Do que se trata, como acontece em todos os processos internos de eleição e mudança, é de seriar os problemas, de avaliar os interesses, de oferecer respostas, uma pregação pública de que todo o corpo de responsáveis políticos, que dependeram de eleições, têm possivelmente mais experiência do que necessitariam. Não parece haver memória de embaraços eleitorais que tenham sido causados pela meditação sobre a complexidade jurídica dos textos em que virão a ser compendiadas as respostas.Aquilo que está em causa não é, em qualquer dos métodos, uma aula de interpretação jurídica ao cuidado dos doutos, é uma pública demonstração dos interesses em causa, dos riscos comparados do conservadorismo e da reforma, dos pontos fortes e fracos averiguados para um auditório que algumas vezes também terá mais experiência do que necessita de exercícios semelhantes. A legitimidade parlamentar não é inferior à legitimidade do referendo, estando a escolha dependente de muitas circunstâncias, entre elas os compromissos assumidos pelas formações políticas. Mas nenhuma destas pode dispensar-se, em tempo suficiente, e neste tema finalmente, de explicar ao eleitorado que interesses nacionais e europeus, que tabela de desafios, que prospectiva do mundo, e de vida vivida de cada um, levam a pedir a adesão a uma mudança proposta. O eleitorado tem experiência e sabedoria demonstradas para compreender isto. Não tem experiência e sabedoria que lhe permitam compreender a política furtiva que tem caracterizado o trajecto europeu.

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