domingo, 29 de maio de 2011

TALENTOS PUJANTES

Sebo subentendia obtusidade... Ora neste Ministério sobrava c talento. Incontestavelmente havia aí talentos pujantes...
- Essa é outra! - gritou Ega atirando os braços ao ar.
- E extraordinário! Neste abençoado país todos os políticos têm «imenso talento», a oposição confessa sempre que os ministros, que ela cobre de injúrias, têm, à parte os disparate que fazem, um «talento de primeira ordem»! Por outro lado a maioria admite que a oposição, a quem ela constantemente recrimina pelos disparates que fez, está cheia de «robustíssimos talentos»! De resto todo o mundo concorda que o país é uma choldra. E resulta portanto este facto supracómico: um país governado «com imenso talento», que é de todos na Europa, segundo o consenso unânime, o mais estupidamente governado! Eu proponho isto, a ver: que, como os talentos sempre falham, se experimentem uma vez os imbecis!
O conde sorria com bonomia e superioridade a estes exageros de fantasista. E Carlos, ansioso por ser amável, atalhou acendendo o charuto no dele:
- Que pasta preferia você, Gouvarinho, se os seus amigos subissem? A dos Estrangeiros, está claro ...
O conde fez um largo gesto de abnegação. Era pouco natural que os seus amigos necessitassem da sua experiencia política, Ele tornara-se sobretudo num homem de estudo e de teoria. Além disso não sabia bem se as ocupações da sua casa, a sua saúde, os seus hábitos lhe permitiriam tomar 0 fardo do governo. Em todo o caso, decerto a pasta dos Estrangeires não o tentava ...
- Essa nunca! - prosseguiu ele, muito compenetrado. Para se poder falar de alto na Europa, como ministro dos Estrangeiros, é necessário ter por trás um exército de duzentos mil homens e uma esquadra com torpedos. Nós, infelizmente, somos fracos ... E eu, para papéis subalternos, para que venha um Bismarck, um Gladstone, dizer-me «há-de ser assim», não estou! .. Pois não acha, Steinbroken?






Eça de Queiróz, in "Os Maias"

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