segunda-feira, 16 de março de 2020

SEMPRE ATRÁS DO PREJUÍZO


SEMPRE ATRÁS DO PREJUÍZO

            Portugal é um país que é gerido andando sempre atrás do prejuízo. Nesta crise concreta que hoje se vive (16/03/2020) percebe-se bem que se andam a tomar medidas com duas semanas de atraso. Um bom gestor, quer privado, quer gestor da coisa pública, deve gerir à frente do prejuízo. Desde Dezembro que se andava a ver o exemplo da China. A propósito, repare-se no caso de Macau que ao 4º (quarto) infectado encerrou tudo e todos. Conteve a disseminação do vírus e há muitos dias que não regista novos casos. De seguida tivemos o exemplo da Itália que relaxou a tomar medidas, que são sempre constrangedoras e impopulares, e pagou, e está a pagar um preço muito elevado. Em Portugal levou-se muito tempo a tomar medidas, e a assobiar para o lado. Está-se a ver o resultado. Como é costume pensaram primeiro no dinheiro. Não se fechar por causa do turismo, da restauração, e etc.. Os negócios em questão. Com aquela falta de visão de estratégia. Se fechassem cedo podiam continuar com o negócio mais tarde. Mais tarde vão ter mesmo que fechar, radicalmente, com a agravante de depois faltar clientela, ou por terem morrido, ou por que, desconfiados, deixarão de frequentar e consumir. Tudo isto pelo eterno defeito dos últimos 40 anos em que só se governa em navegação à vista, ou seja, em função dos resultados eleitorais. Para tal não convém tomar medidas impopulares e desmotivadoras dos negócios partidários. Mas a factura vai chegar, e vai ser pesada. Aguardem.
            Depois temos a gestão da crise em si. Em Espanha já estão em quarentena, tendo as forças policiais e militares em acção no terreno. Em Portugal, há muito em crise sem ajuda nenhuma do covid19, será algo difícil de implementar com eficácia. Porque não há respeito nenhum à autoridade. Foi um trabalho, constante, ao longo de anos, o minar o respeito à autoridade do estado. A justiça em muito contribuiu para tal, protegendo o bandido e perseguindo os polícias, desautorizando-os. Temos agora esta problemática com alguns juízes da Relação de Lisboa que, com certeza irá trazer alguma luz ao tema. Só luz, porque consequências não haverá, pois desde logo quem julga quem? Alguns ministros que passaram pelo MAI não perceberam qual era o papel da GNR, confundindo-a com a polícia. Desastre após desastre, nunca esquecendo a descapitalização das instituições, o que muito desmoraliza. Só foram pródigos em soltar os cordões à bolsa para a criação da Alta Autoridade para a Protecção Civil, bem como para programas tecnológicos associados, caríssimos e ineficientes, a fazer fé nos jornais ao longo dos anos. E não se percebe porque é que esta alta autoridade não foi extinta de imediato a seguir aos incêndios de Pedrógão e adjacentes. Depois temos as forças armadas. Que em tempos funcionavam como reserva moral da nação. Hoje já não. O que preocupa o sempre esclarecido professor Adriano Moreira. Alguns generais, há pouco tempo, escreveram uma carta ao Presidente da República, chamando a atenção para a falência das forças armadas, por múltiplas razões. Mas falida a reserva moral, de que os muitos casos que pululam no seio delas, e não só Tancos, que além da questão factual expõe o exército ao ridículo, que podem clamar? Com tudo isto, e reconhecendo-se uma natural indisciplina de cidadania aos portugueses, alguém acha que as forças militares e paramilitares podem impor alguma autoridade delegada do ESTADO? E isto vai resultar em quê? Desastre.
            Outra lição a tirar é gerir-se só em função do dinheiro. Sem se ter atenção aos centros de decisão. Tenho ouvido a muito políticos profissionais, que nunca trabalharam na vida verdadeiramente, empregarem chavões sobre a mobilidade laboral, as exigências da globalização, rentabilidade do investimento, eficácia de meios, com muita utilização da palavra alavancagem, que dita por eles que nada sabem de física, nem são capazes de calcular as forças intervenientes nos extremos da alavanca, nem as distâncias ao ponto de apoio. Com isso deixou-se na mão da China a incumbência de produzir muita coisa, sobretudo miudezas, para abastecer o mundo. Só que agora a China teve de travar a produção por ser, também ela, vitima desta pandemia. E de repente faltam as máscaras de protecção e demais material hospitalar. E outras coisas, que não se fabricam já na Europa. E agora, já que não pensaram antes, como vão resolver? É o nacional desenrascanço? Eu lembro-me de um jornal regional, de uma região que me é muito querida, publicar, muito ufano, há já uns largos anos, que determinado empresário tinha ido para a Chinar montar uma fábrica de seringas. Seria muito mais rentável, ao que parecia. Diminuía-se a empregabilidade em Portugal, mas o empresário teria muito mais rentabilidade. Mas ficámos dependentes, de miudezas, da China. E agora. Isto faz-me lembrar a Manutenção Militar, que antigamente tinha uma capacidade de abastecer o país, em caso de grave crise, que impedia carência grave na população. Extinguiram-na. Muitos não descansaram enquanto não o fizeram. O Laboratório Militar esteve na calha para ser extinto. Antes desta crise já tinha demonstrado a sua importância na crise de medicamentos oncológicos. Mas os políticos têm objectivos que a razão não entende. Ou então entende …, mas isto é Portugal.
            Leio os jornais e vejo que ninguém liga às instruções dadas. No aeroporto são ajuntamentos para além do recomendável e saem sem haver controlo sanitário e consequente quarentena. Os turistas, que vão e vêm, sem passarem cartuxo. Li algures que são bruscos e até malcriados, quando lhes chamam a atenção para as recomendações e ditames das autoridades. Há aqueles que impedidos de desembarcar em Lisboa, o fizeram em Cádis, e vieram para Lisboa de autocarro. Não percebi o circo. Mais valia tê-los deixado desembarcar de vez para o aeroporto. É só encenações. Mas enfim, o poder é cénico. A juventude tem uma falta de respeito por tudo isto que nos faz temer, bastante, pelo futuro. Conclui-se que há muita dificuldade em se impor autoridade. Paciência, veremos no que isto vai dar.
            Mas, nesta crise, estamos muito atrasados na imposição de medidas drásticas. (O eleitorado, a que não se pode desagradar). Devíamos já fazer o que a Espanha está fazendo, sem estar à espera de chegar aos números a que a Espanha já chegou, para então se actuar. O Presidente convocou ontem o Conselho de Estado para Quarta-feira. Porque não para hoje? Porque perder ainda mais dois dias? Por causa dos incêndios de Pedrógão, que citámos antes, o Presidente Marcelo publicou um artigo em 2018 em que disse:« Se formos capazes de fazer reviver até 2023 o que importa que reviva, Portugal será diferente. Se não formos capazes perdemos uma oportunidade histórica e condenamos alguns portugáis a serem muito ignorados, muito esquecidos, muito menosprezados e isso significa que falhámos como país.» Estamos já em 2020, não antevejo essa capacidade de fazer reviver o que importa, pelo que acho que falhámos. Espero bem que, como pessimista militante que sou, estar bem enganado e que os anseios do Senhor Presidente se concretizem. Mas a gestão desta crise não realça isso. E nunca esquecendo o seu discurso de Ano Novo no Corvo. Voltarei à análise do artigo e do discurso noutra ocasião.
            Devo realçar aqui, e hoje, sem tecer loas, que os Governos Regionais da Madeira e dos Açores se adiantaram ao da República em medidas que conduzissem a eficácia. Não sei qual o resultado que vai advir, mas reconheço o mérito, e destaco que nos Açores são 9 ilhas com dificuldades acrescidas para se gerir a questão. Mas na condicionante actual o Governo Regional, e restante administração pública, estão a cumprir bem ao seu nível.   Gostaria de vir a dizer mais tarde que a incúria não foi fatal para muitos.