É algo que os agentes políticos da actualidade não têm. Infelizmente. E, com isso, todos perdemos. Aqui deixo um trecho de "Juízo Final", livro sempre a revisitar, de Franco Nogueira, que ilustra a diferença entre agilidade mental e a mediocridade que constitui o horizonte que nos limita.
Ao arrepio das aparências, são mais do que incertos os tempos neste final de século e de milénio. Proliferação possível da capacidade de produzir armas nucleares, surto de novos centros de poder económico, crescimento financeiro e industrial de vários países, crises de energia e ameaças aos pontos de abastecimento – são factores cujas consequências estão longe de esgotadas. Não convém que nos façamos ilusões. Em qualquer momento podem surgir novos centros de decisão nuclear. Um Japão, uma Alemanha reunificada, podem converter em potencial militar o seu imenso potencial económico e industrial. Estaria então profundamente alterado o equilíbrio bipolar que, mediante a dissuasão recíproca pelo terror, administrou a paz precária até esta última década do século e até ao colapso da União Soviética. Haverão de multiplicar-se, agora que se diluiu a bipolaridade, os desafios tanto ao poder dos Estados Unidos como ao que restar da União Soviética. Não cabe fazer futurologia, decerto, mas parece útil para todos que os homens de Estado não percam de vista que nada há de mais frágil, nada há de mais fluido, nada há de mais misterioso do que a fronteira entre a paz e a guerra. Esta última é, como disse alguém, a política conduzida por outros meios; e também se dirá que a paz pode ser – e quase sempre é – a guerra conduzida por outros meios que não os militares. Pode surgir a ruptura da paz em qualquer instante; e podem desencadear-se acontecimentos que arrastam a outros e escapam à vontade e controle dos homens. A desintegração da União Soviética, o drama dos Balcãs, o enredo do Médio Oriente, legitimam todos os temores. Não pensemos que a afirmação de que a guerra nuclear significa uma catástrofe sem limites garante por si a paz. E ninguém pode prevenir uma súbita descoberta tecnológica que altere a situação existente. Nenhum de nós, ninguém em seu juízo deseja a guerra, e todos devemos acalentar e exprimir a esperança na paz. Mas para colaboração na paz ou sustentáculo na guerra, todos os portugueses estarão de acordo em que Portugal deve alinhar as suas pedras, todas as suas pedras, bem colocadas e bem afeiçoadas.
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