Um excelente poema de uma boa amiga, datado de 1999. Já publicado no seu blog, O JARDIM DA ASPÁSIA.
CARTA @ AMIG@
Olá, Amig@, resolvi escrever-te
só para dizer... que não há nada de novo.
Olha, saí, meti-me no carro
e chegando ao semáforo seguinte
vi o mesmo pedinte
com que há anos deparo.
Dei-lhe uma moeda de vinte.
Na fila de trânsito,
vi as mesmas caras agressivas
por dentro dos vidros embaciados.
Sorrisos não vi, nem expressões vivas:
só olhares cansados.
Também quis entrar no café,
mas era tal a fumaça lá dentro
que achei melhor adiar o momento
e fugi dali a sete pés.
Deu-me para comprar o jornal,
mas também não sei para quê:
já ontem, na TV, disseram tudo igual.
Parece que o principal
é que caiu um avião no Mar do Norte.
Mas olha, tiveram sorte:
dos noventa só morreram vinte e tal,
incluindo um doente de Sida, por sinal,
a quem já tinham lido a sentença de morte.
Os pais do rapaz até deram graças
por ele ir de repente
e não o verem mais pela casa
a morrer lentamente.
Das famílias dos outros vinte e tal
é que não sei o que disseram,
não vinha no jornal,
talvez não tenha sido tão sensacional.
Como vês, vai tudo normal.
Passei ali pelos arredores
e lá estavam os arrumadores
à porta do Centro Comercial
a arrumarem os senhores doutores.
Também estavam uns ciganos vendedores
discutindo com eles um espaço vital
para estenderem no chão uns cobertores
onde exporem o material.
Mas apareceu um carro da polícia
e debandaram todos por igual.
Enfim, virão tempos melhores.
De saúde, olha, vou assim-assim,
uns dias pior, outros menos mal.
Que se há-de fazer? É fatal.
E assim cheguei ao fim.
Como vês, não há nada de especial.
Fica bem, ou, pelo menos, tu também, menos mal.
Beijinhos da
L.
(Leonor 1999)
quinta-feira, 4 de março de 2010
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1 comentário:
CARO ZÉ, OBRIGADA PELA PUBLICAÇÃO!
BOM DOMINGO E
UM ABRAÇO!
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