segunda-feira, 8 de março de 2010

SUCESSO OU FELICIDADE?

Pode ser um problema que se ponha. Hoje em dia a educação e a instrução das crianças, dos jovens, tem muito a componente do sucesso. Nenhuma componente para a felicidade. E aqui estou sempre a referir-me à civilização ocidental, tal como é aceite este conceito. Circula muito na net um mail, com várias variantes, com o tema «Como é que nós sobrevivemos?». E esta sobrevivência tem a ver com os cuidados e cautelas que hoje existem, e que há uns 30 e mais anos não existiam. As pessoas eram mais pobres, com menos utensílios para consumir, mais solidárias e mais livres. Isto pode parecer estranho. Mas as crianças, há 30 e muitos anos atrás, eram mais soltas na sua criação. O espaço público não lhes estava vedado e, no meio das suas obrigações, que incluíam estudar e trabalhar, tinham tempo para brincar. Eu disse trabalhar? Disse. Trabalhar ainda não era um estigma para a juventude. Corria-se, pulava-se, esfolava-se e ria-se. Depois também não se tinha competição na escola. Se alguém tinha um 14, ainda bem. Se alguém tinha um 10, ainda bem, também. Ter negativa é que era triste, e não fazia a alegria dos outros a infelicidade de alguém. Os professores também ainda não eram ignorantes. Não se buscava um tal de sucesso com avidez, nem cupidez. Vivia-se a vida. E era-se feliz, sem que se buscasse essa felicidade na extremidade de qualquer arco-íris. Talvez para as raparigas esses tempos ainda não fossem tão bons, porque não lhes era dada a liberdade que os rapazes tinham. Hoje esse problema não se põe para elas.
Mas hoje qual é a existência das crianças e dos jovens? Tiraram-lhes a liberdade. Já não brincam. Há por aí uns gurus da educação, com padrões estereotipados, que deturparam os objectivos da educação. As crianças têm de ser sempre vigiadas. A segurança impõe isso. Deixou-se chegar a insegurança e a ineficiência da justiça ao actual estado. Não usam o espaço público, a não ser em manifestações de manada, e para serem cool, sempre na perspectiva do pai, ou da mãe, ou de ambos se ainda estiverem casados. Depois a criança tem de ter sucesso. Ou seja, tem de vir a ter um percurso para ganhar muito dinheiro, para ter um muito bom carro, para exibir, uma muito boa casa, que na prática pouco usa, por só lá dormir, uma casa no Algarve, onde se esfalfa para lá chegar no seu muito bom carro, para voltar ainda mais cansado do que foi. E tem de ter uma parafernália de objectos eléctricos e electrónicos para exibir às visitas, mesmo que pouco proveito tire deles, e é quando os sabe manejar em pleno. E para alcançar esse sucesso tem de competir. Mesmo que não queira nem lhe apeteça. Tem de competir. Que é o que os paizinhos fazem com as suas crianças, competem com os outros pais. E competem na escola, na música, no ballet, na ginástica, na natação, na esgrima, no coro da igreja e na má educação. Competem. Não brincam. Sempre fechados em casa, onde são feitos prisioneiros da segurança, do conforto, e da competição. Têm tudo ao seu dispor para se poderem valorizar, no seu sucesso, lá em casa. Têm uma vida vazia de existência. Vivem um mundo virtual. Começam mal e acabam pior. Podem ganhar dinheiro, mas não se realizam. Podem ter sucesso, mas não passam de uns patifezinhos. E depois serão incapazes de se relacionarem de forma estável e não virtual. Irão sempre reproduzir, nos filhos, que entretanto terão no acaso, ou para fazerem parte do sucesso exibicionista, já no limite biológico para o fazerem, os mesmos modelos idiotas com que foram criados. Em cidades frias de humanismo, egoístas, onde só se pode subsistir na rua integrando um bando. Aqueles cujos pais não tiveram sucesso, ou dinheiro, esses estão mesmo na rua. Não competem, lutam. Têm de sobreviver. Para isso, lutam. Os de sucesso, egoístas, pouco lhes importam os da rua. Eles, formatados, vão tentar ter tudo. A qualquer preço. Carro, casa, filhos, posição, marido/mulher com influência e um par. No fundo, infelizes. Prisioneiros dum sistema que alimentam. Estragando uma sociedade que só podia evoluir com homens livres.

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