segunda-feira, 5 de maio de 2008

AS ASAS DO PORTUGUÊS

Um excelente artigo de José Eduardo Agualusa intitulado "EÇA DE QUEIRÓS E AS ASAS DO PORTUGUÊS", publicado na revista LER nº 69, deste mês. Artigo que deve ser lido na íntegra. Mas relevo aqui três passagens desse artigo:



Hoje debruço-me sobre Portugal de uma va­randa mais vasta - a Eternidade - e de novo me aflige o desdouro. Não que Portugal esteja pior do que há cem anos; está todavia mais pequeno. Já nem é bem um país – é um resumo.
(...)
Hoje erramos em ponto pequeno, e ainda por cima por imitação. Além disso, sendo minúsculos, ainda guardamos a memória do tempo em que fomos grandes, e isso é pior do que ser pequeno sem jamais ter sido grande. É um destino em tudo idêntico ao da bela mulher que envelhece.
(*)
(...)
Há tempos passeava eu, placidamente, era um fim de tarde lento e melancólico, junto aos fortes portões do Paraíso, quando vi chegar um português. Via-se pela alma que fora um homem sem maldade. Também se via, olhando melhor, que fora inteiramente sem maldade, não por um esfor­ço de vontade, mas por pura preguiça. São Pedro recebeu-o com um fatigado abraço - lembrem-se que findava o dia - e estendeu-lhe um par de asas. O português protestou: «E que farei eu com essas asas?» São Pedro, encolhendo os ombros magros: «Ora, filho, voa!» O português recuou, aterrado: «Ah não! Isso é que não pode ser! Fique lá o senhor com as asas que eu se vim para aqui foi para descansar.» E assim vamos nós.

(*)Sobre este tema da memória do termos sido, já tenho, recorridamente, divagado por aqui. O último, alguns postes abaixo, foi "O passado cabe todo num livro de 600 páginas"


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