quarta-feira, 20 de setembro de 2006

VÃO DIZENDO, POR ALI E ALI.

A ideia de que o Ocidente deve promover a democracia ou a justiça é uma ideia colonial. Quando fala na "defesa da civilização" Bush repete à sua maneira os sermões da esquerda sobre o desespero e a pobreza das massas muçulmanas. Parece que "o homem branco" voltou a carregar o seu "fardo" e se prepara outra vez para reformar a terra. Felizmente, o "homem branco" já não quer reformar a terra, quer petróleo. Interessa ao islão (ou parte dele) vender petróleo e comprar tecnologia, interessa ao Ocidente comprar petróleo e vender tecnologia: e é bom que as coisas fiquem por aqui. Isto implica evidentemente inverter a política de Bush e Blair: da ingerência para a não-ingerência e de uma total tolerância interna (como em Inglaterra) para duras regras de cidadania. A confusão alimenta o terrorismo, a clareza contribui para o isolar e conter.

VP, Público de 15.09.2006


Quem lê livros não ignora que o nosso amável Portugal nunca deixou de protestar contra a corrupção: dos regimes, dos governos, do rei, da corte, da Igreja, dos partidos, dos políticos, dos padres, dos juízes, da administração central, das câmaras, da banca, da indústria, do comércio e da polícia. Uma sociedade pequena e pobre (e, por cima, católica) gera necessariamente corrupção. O número, o anonimato e a distância reforçam o rigor; a estreiteza, a convivência e a proximidade criam o mundo paralelo dos "compadres". Escrevi um dia que Portugal só "funcionava" pela corrupção. Caiu o céu. Infelizmente, é assim.

VP, Público de 16.09.2006

Não há uma solução política para a crise do Darfur. Depois de tanta morte e destruição, todas as partes deveriam ter já percebido que só um acordo político, em que todas as partes interessadas participem, pode conseguir que a paz chegue à região.Há 12 anos, a ONU e o mundo não cumpriram as suas obrigações para com o povo ruandês, num momento de necessidade. Podemos agora, em consciência, assistir passivamente e com indiferença à tragédia que se agrava no Darfur?

Kofi Annan, Público de 17.09.2006

O imperativo de superar os equívocos do multiculturalismo, no relacionamento com os muçulmanos na Europa, resulta da comprovação de que o propósito dos islamitas radicais é ressuscitar os tempos do enfrentamento militar entre o Islão e o Ocidente. O seu Calcanhar de Aquiles e a nossa vantagem flagrante advêm do fato de que os últimos séculos de convivência não podem ser ignorados. Comprovam que podemos (e devemos) coexistir pacificamente, o que não significa ignorar divergências e dificuldades.Em fins de 2005, na colaboração habitual que mantém em jornais europeus, Francis Fukuyama advertia para a necessidade da Europa reconhecer o que então denominou de "Jihad dentro de casa". A degolação ritual do holandês Theo Van Gogh (nome fácil de guardar pela associação, ainda que indevida, ao grande pintor), ocorrida em Novembro de 2004, por muçulmano nascido e educado na Holanda, correspondeu ao primeiro grande choque com uma realidade - que muitos ainda hoje parecem não ter levado em conta, inclusive responsáveis governamentais -, embora tivesse sido antecedido pelo atentado de 11 de Março daquele ano, em Madrid. Talvez devido a questões de ordem interna, este último se não passou em brancas nuvens, também não mereceu maior atenção. Contudo, os atentados bombistas de 7 de Julho do ano seguinte, em Londres, tiveram o mérito de repor o tema em seu devido lugar. Resumindo a questão em termos apropriados, escreve Fukuyama: "países como Holanda e Grã-Bretanha precisam de inverter as políticas multiculturalistas contraproducentes, que criaram refúgio para o radicalismo, e têm de reprimir aos extremistas."

António Paim, Público de 18.09.2006


Até agora, a Europa reagiu como se esta "aliança" não acrescentasse nada às ameaças que já existem de atentados terroristas. Por estranho que pareça, a ideia de que o risco diminui consoante as manifestações de compreensão de cada Estado por este tipo de grupos mantém-se inabalável. Numa cultura em que predomina a convicção de que tudo quanto aconteceu nos últimos cinco anos não é senão a violência do Ocidente a abater-se em ricochete sobre as suas próprias cidades, torna-se difícil aceitar a evidência de que o terrorismo não distingue entre colonialistas arrependidos e colonialistas por arrepender.

Diogo Pires Aurélio. DN de 19.09.2006

Cumprindo a habitual relação do previsto com os factos, aconteceu a outra coisa, isto é, aquilo que não constava nem das previsões, nem dos projectos, nem das promessas. O resto do mundo comprovou a lei da reflexividade utilizando a ciência e a técnica dos antigos poderes hegemónicos, mobilizou o capital de queixas para a retaliação e não para enriquecer a sabedoria da governança mundial, estruturou uma heterodoxia de combate, desactualizou a polemologia clássica fazendo do terrorismo global o conceito emblemático da entrada no novo milénio. Não faltam comentários no sentido de que esta nova era, de início muito convencionalmente marcada pelo 11 de Setembro, criaria também uma habitualidade das sociedades civis envolvidas pela fria táctica de sacrificar em primeiro lugar inocentes, isto para destruir ao mesmo tempo a relação de confiança dos cidadãos com os governos, e o modelo contratualizado da sociedade civil.

AM, DN de 19.09.2006

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