Se o regime democrático tem a vocação de permitir a todos, pelo menos teoricamente, a igualdade de oportunidades no acesso ao saber, à cultura, à riqueza e ao poder, não tem o condão de tornar iguais pessoas diferentes na educação, no carácter, na iniciativa e até na sorte. Não transforma a vulgaridade em educação, não equipara o preguiçoso e o trabalhador, o ignorante e o ávido de saber, o passivo e o lutador. Em Portugal, o carácter recente da democracia, o grande atraso anterior, a mudança vertiginosa das últimas décadas tornaram as coisas ainda mais complexas: entrou no mercado e em todos os sectores da sociedade uma geração frequentemente deslumbrada com o seu próprio acesso ao poder e ao dinheiro, sem bases culturais e educativas sólidas e sobretudo sem consciência da sua responsabilidade social. Repito: a democratização é uma extraordinária força de desenvolvimento, libertando energias, talentos e criatividade, mas não torna igual o que é diferente, e ainda bem. E não é o grau ou a função de doutor, gestor, catedrático ou ministro que confere, por si só, a qualidade profissional e sobretudo humana. Basta olhar à nossa volta e ficamos esclarecidos...
Esther Mucznik, “Em defesa das elites”, hoje no Público.
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