terça-feira, 16 de outubro de 2007

A DEMOCRACIA DE OPINIÃO

A democracia de opinião alimenta imensas ilusões. Além da tentação natural de fazer crer que ela representa a quinta­-essência da democracia pois joga no velho ressalto do apelo directo ao povo, alia-se à ideia de que torna a sociedade trans­parente, legível, fácil de compreender. Dado que, graças às sondagens e a um corpo-a-corpo com os cidadãos, ela pretende ter penetrado o segredo dos ,nossos humores colectivos e dos nossos impulsos, a sociedade parece-lhe límpida. Erro fatal: quanto mais os ritos e os códigos desta democracia bizarra parecetn omnipresentes, tanto mais a sociedade se torna pelo contrário opaca. Nada é mais natural: o descrédito dos modos de representação tradicional pesa sobre os dois quadros. Ele é consubstancial, sabemo-lo, à irrupção da nova santíssima trindade, a opinião, os média, o juiz; mas vai a par com uma sociedade cada vez mais repartida, percorrida por ramais e estruturas escondidas no mais profundo dela própria, a ponto de, ao lado do nosso mundo visível, se desenvolver um outro universo invisível, ilegal e que vê convergir todas as formas de marginalidade, de clandestinidade, de tráficos, mesmo de mafias. Por um estranho paradoxo, quanto mais o sistema parece demo­crático e transparente, tanto mais a sociedade simultaneamente se desmascara.
Alain Minc, in "A Embriaguez Democrática"

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